O Serviço de Inteligência Estrangeiro da Federação Russa, o SVR, leva adiante um manual da era soviética, usando seus laços com a Igreja Ortodoxa Russa, ou Patriarcado de Moscou, para influência estratégica. Antes alinhada com a KGB, hoje a Igreja Ortodoxa Russa continua sendo uma instituição espiritual e uma ferramenta de política externa em meio à guerra russo-ucraniana.
A galeria a seguir investiga o relacionamento complexo entre espiões e clérigos, explora métodos empregados pela inteligência russa e considera o impacto na credibilidade da Igreja como uma organização baseada na fé, mas entrelaçada com a arte de governar. Clique para entender melhor os detalhes.
Desde a década de 1940, a Igreja Ortodoxa Russa tem sido usada para endossar regimes autoritários e propagar valores estatais. Mesmo após o colapso da União Soviética, a Igreja continuou sendo um importante ator, alinhando-se com a política externa russa para projetar influência e reforçar objetivos estatais no cenário global.
Arquivos soviéticos revelam que o Patriarca Kirill, nascido Vladimir Gundyaev, nem sempre foi apenas um homem do clero. Antes de ascender para liderar a Igreja Ortodoxa Russa, ele supostamente serviu como oficial ativo na KGB.
O Patriarca Kirill compartilha mais do que uma missão espiritual com o presidente Vladimir Putin. Ambos estão profundamente enraizados no legado de inteligência da Rússia: Kirill como um ex-oficial da KGB e Putin como um veterano da KGB e ex-diretor da agência sucessora, o Serviço de Segurança Federal.
Arquivos suíços revelam que o Patriarca Kirill, enquanto representante de Moscou no Conselho Mundial de Igrejas em Genebra durante a década de 1970, trabalhava para a KGB, com o objetivo de influenciar o Conselho Federal Suíço por meio da diplomacia religiosa.
Arquivos suíços, rotulados como "Monsenhor Kirill", revelam a missão secreta dada pela KGB ao Patriarca Kirill sob o codinome “Mikhailov”. Os registros também revelam que o Conselho Federal Suíço já havia sido infiltrado pela rede de inteligência soviética.
Embora os arquivos soviéticos e suíços sugiram laços entre o Patriarca Kirill e a KGB, seu sobrinho, Mikhail Gundyaev, um clérigo chefe em Genebra, rejeitou as alegações em uma entrevista ao jornal Sonntagszeitung em 2023, afirmando que seu tio provavelmente não era um agente de inteligência.
O sobrinho do Patriarca Kirill acrescenta que Kirill estava meramente “sob a supervisão rigorosa da KGB”. A Igreja Ortodoxa Russa permaneceu em silêncio, e o Conselho Mundial de Igrejas insiste não ter conhecimento do assunto.
Durante a década de 1960, agentes da KGB exerceram considerável influência dentro da Igreja Ortodoxa Russa, transformando-a em um instrumento fundamental para controle político e operações de inteligência, desde vigilância doméstica até espionagem internacional.
Registros desclassificados da KGB revelam que o Metropolita Filaret de Kiev, uma figura importante na Igreja Ortodoxa Russa durante as décadas de 1970 e 1980, foi recrutado como agente sob o codinome "Antonov" antes de 1957.
As frequentes viagens internacionais do Metropolita Filaret destacam seu papel ativo como um experiente agente da KGB. Os arquivos do Serviço de Segurança do Estado Ucraniano de 1957-58 mencionam "Antonov", que supostamente era quem fornecia inteligência sobre delegações visitantes, incluindo suas ações e conduta.
Um documento da era soviética encontrado na Estônia sugere que o Patriarca Aleixo II, antigo chefe da Igreja Ortodoxa Russa, não era apenas um líder espiritual, mas um agente da KGB de pleno direito. Esta revelação se soma à narrativa em andamento do complexo envolvimento da Igreja com a inteligência soviética.
Rumores sobre os laços do Patriarca Aleixo II com a polícia secreta soviética têm circulado desde 1991, citando seu codinome "Drozdov" (Sapinho). No entanto, um documento recém-descoberto oferece a primeira prova tangível que sugere que ele não era meramente um colaborador passivo, mas um agente ativo da KGB já em 1958.
O documento sugere que Aleixo II alavancou laços com a KGB para avançar na Igreja em meio à repressão soviética. A Igreja Ortodoxa descartou isso como uma falsificação sem provas sólidas, mas o silêncio de Aleixo deixou as alegações sem contestação, alimentando especulações sobre fé e envolvimento do estado.
Nem todo o clero ortodoxo russo se alinhou com a KGB; muitos resistiram à colaboração, frequentemente pagando um alto preço. Essa é a história de Alexander Vladimirovich Men, um padre ortodoxo russo, teólogo e estudioso bíblico, que foi perseguido pela KGB e assassinado em circunstâncias inexplicáveis em 1990.
Outro exemplo de coragem que desafiou a repressão soviética foi o padre Dmitri Dudko. Na década de 1970, seus sermões inflamados em Moscou desafiaram abertamente o ateísmo imposto pelo estado, tornando-o um farol de resistência. Sua postura ousada teve um custo, pois a KGB o sujeitou a um assédio implacável.
Padre Dudko ressoou com muitos ao abordar a decadência moral, o alcoolismo e o vazio espiritual da vida soviética. Em janeiro de 1980, ele foi preso por supostamente passar "materiais caluniosos" para jornalistas ocidentais e foi coagido a uma confissão encenada na televisão, renunciando publicamente às suas opiniões.
Em seus últimos anos, sob a perestroika de Gorbachev, o padre Dudko abraçou ideologias nacionalistas e autoritárias, defendendo uma liderança que lembrava Stalin ou Putin. Essa mudança afastou muitos de seus antes devotados apoiadores, deixando-o desconectado da geração mais jovem que ele havia inspirado.
A infiltração calculada da KGB na Igreja Ortodoxa transformou-a em um instrumento cultural vital de controle. Embora a Guerra Fria tenha acabado há muito tempo, a Igreja ainda exerce influência significativa como uma ferramenta de estado, o que a coloca como um assunto digno de escrutínio contínuo.
Em março de 2024, a Suécia interrompeu o financiamento para igrejas ligadas ao Patriarcado de Moscou após relatórios de inteligência revelarem seu uso em operações de espionagem e influência híbrida. As autoridades destacaram os potenciais riscos de segurança que essas igrejas representavam para a OTAN, dada sua presença em áreas estratégicas.
Uma investigação feita pelo jornal Norran revelou conexões entre a Igreja Ortodoxa Russa e a inteligência russa. O serviço de segurança da Suécia (Säpo) rotulou a Igreja Ortodoxa como um risco à segurança nacional, citando uma ameaça elevada de sabotagem russa.
A investigação revelou laços entre igrejas ortodoxas na Suécia, Ucrânia e Rússia, com clérigos em Västerås recebendo medalhas assinadas pelo Serviço de Inteligência Estrangeiro da Rússia. Um funcionário da embaixada russa, supostamente ligado à espionagem, também compareceu à inauguração de uma igreja na Suécia.
Preocupações sobre o uso de igrejas ortodoxas russas pelo Kremlin para inteligência levaram a Bulgária e a Macedônia do Norte a expulsar o clero russo. O FBI também emitiu alertas sobre o papel da Igreja nas operações secretas de Moscou, destacando uma crescente resposta internacional.
No final de 2024, a inteligência tcheca começou a investigar a Igreja Ortodoxa Russa sobre suspeitas de espalhar propaganda russa. As autoridades também impuseram sanções ao Patriarca Kirill por endossar a guerra da Rússia contra a Ucrânia, aprofundando ainda mais o escrutínio das atividades e do papel geopolítico da Igreja.
Em setembro de 2023, a Bulgária expulsou o Arquimandrita Vasian, chefe da Igreja Ortodoxa Russa no país, e dois funcionários da Igreja de São Nicolau, o Milagroso, em Sófia. O governo justificou a ação, destacando crescentes apreensões sobre influência estrangeira ligada à Igreja.
A embaixada do Kremlin em Sófia rotulou a expulsão do Arquimandrita Vasian e dos dois funcionários da Igreja pela Bulgária como "inaceitável". O incidente ressalta os temores crescentes no leste europeu sobre o papel da Igreja Ortodoxa Russa no avanço da agenda geopolítica de Moscou.
A Igreja Ortodoxa Russa tem estado entrelaçada à diplomacia em seu alcance global, frequentemente ecoando as perspectivas do Kremlin sobre a Ucrânia e a influência ocidental. Relatórios sugerem que há esforços de poder brando da Igreja em regiões importantes como os Bálcãs e o Oriente Médio, reforçando sutilmente as ambições geopolíticas da Rússia.
O papel da Igreja Ortodoxa Russa provavelmente se expandirá à medida que o Kremlin continua a depender da Igreja para diplomacia informal e inteligência. Isso se alinha com a estratégia de guerra híbrida mais ampla da Rússia, alavancando a fé como uma ferramenta para projetar influência e promover objetivos geopolíticos.
Alegações persistem sobre os laços da Igreja com a inteligência russa moderna, com a liderança do Patriarca Kirill frequentemente no centro das atenções. Essas alegações mantêm sob escrutínio o papel em evolução da Igreja em assuntos de estado.
À medida que a OTAN e a União Europeia reforçam os esforços de contrainteligência, o escrutínio das atividades da Igreja Ortodoxa Russa e as expulsões de clérigos provavelmente aumentarão. Em resposta, espera-se que Moscou se adapte, redirecionando as operações de influência para organizações proxy, para a diplomacia cultural e para redes financeiras.
Fontes: (Belsat) (Politico) (Grey Dynamics) (Novaya Gazeta)
Os laços complexos da Igreja Ortodoxa Russa com o serviço secreto
Uma relação complexa de influência religiosa e poder político
LIFESTYLE Propaganda
O Serviço de Inteligência Estrangeiro da Federação Russa, o SVR, leva adiante um manual da era soviética, usando seus laços com a Igreja Ortodoxa Russa, ou Patriarcado de Moscou, para influência estratégica. Antes alinhada com a KGB, hoje a Igreja Ortodoxa Russa continua sendo uma instituição espiritual e uma ferramenta de política externa em meio à guerra russo-ucraniana.
A galeria a seguir investiga o relacionamento complexo entre espiões e clérigos, explora métodos empregados pela inteligência russa e considera o impacto na credibilidade da Igreja como uma organização baseada na fé, mas entrelaçada com a arte de governar. Clique para entender melhor os detalhes.